Em uma saída para as lojas é
impossível não notar a alta generalizada de preços dos produtos, muito além da
taxa oficial da inflação, que está na casa de 12% em 12 meses. Veja alguns
exemplos. A peça mais procurada durante a pandemia, a máscara, custava R$ 19,90
(o pacote com duas unidades da marca Lupo), assim que foi lançada. Hoje, R$ 26.
Um par de meias masculina clássica da mesma marca, que custava R$ 14,80 em
dezembro de 2019, passou para R$ 17,70 em dezembro do ano passado e para R$
19,80 hoje. Uma camisa masculina da Remo Fenut, vendida a R$ 60, hoje sai por
R$ 100. Um par de sapatos masculino da Fascar, que era vendido a R$ 450 antes
da pandemia, hoje custa R$ 630.
Em um país onde as famílias estão
com o orçamento mais apertado e bem mais endividadas, comerciantes quebram a
cabeça para driblar a forte pressão inflacionária. “O cenário de hoje faz
lembrar o final da década de 80, quando o país enfrentou uma escalada de preços
absurda”, afirma Thiago Sitta, sócio da Remo Fenut, loja de roupas masculinas.
De acordo com ele, os seus custos
de produção subiram pelo menos 50% do final do ano passado até agora. “(Eu) Pagava
entre R$ 20 e R$ 25 para confeccionar uma camisa. Hoje, pago R$ 37, R$ 38”,
diz.
Rafael Borges de Souza, sócio da
Fascar, diz que os custos dos insumos para a produção de sapatos subiram cerca
de 30% somente neste ano, com destaque para os produtos químicos. Isabelle
Rochat, franqueada da Lupo com seis lojas em São Paulo e Curitiba, diz que,
desde o início do ano, os custos de meias, peças íntimas, pijamas e linha
esportiva subiram 15%.
A mão de obra também está mais
cara e mais difícil de achar, dizem os empresários, especialmente para realizar
trabalhos mais específicos, como pesponto nos calçados e nas roupas. Luís
Ataíde, sócio da Confecção Barcelos, que fabrica ternos, informa que a falta de
costureiras e também de tecidos provocou uma queda de 40% na sua produção.
Antes da pandemia, Ataíde
produzia até 5 mil peças por mês para entrega em 30 dias de um lote de mil
peças. Hoje, este número chega a 3 mil peças no máximo, para entrega em 45
dias. Um terno básico que ele vendia para os lojistas a R$ 130, hoje sai por R$
150. “Os aumentos de custos são de 15% a 20%”, diz ele.
Situação vivida pelos empresários
citados acima exemplifica o que acontece em todo o país. Os produtos que
dispararam de preços estão espalhados por todos os setores do varejo. Pior, de
acordo com os comerciantes, é que até o momento não há sinais de melhora do
cenário até o final do ano. A pressão da indústria continua forte, dizem eles.
Levantamento do IBGE revela que
nos últimos 12 meses, encerrados em março deste ano, o Índice de Preços ao
Produtor (IPP) subiu 19,8% e o Índice de Preços no Varejo (IPV), 13,5%. De 10
setores considerados no levantamento, cinco mostram alta de preços da indústria
maior do que a do varejo. São eles, supermercados e hipermercados, farmácias e
perfumarias, combustíveis e lubrificantes, livrarias e papelarias e material de
construção.
Os setores que conseguiram repassar
os custos foram móveis e eletrodomésticos, informática e comunicação, artigos
de uso pessoal e doméstico e tecidos, vestuário e calçados e veículos.
Vale lembrar que esses números do
IBGE, levantados por Fábio Bentes, economista da CNC (Confederação Nacional do
Comércio), compõem uma média. Muitos lojistas asseguram que conseguem repassar
apenas parte da alta de custos para os preços, até porque o cenário não está
nada favorável ao consumo no país.
Souza, da Fascar, diz que o
volume de vendas hoje é 50% menor do que o registrado em 2019, quando a rede
comercializava cerca de 14 mil pares de sapatos por mês. Sitta, da Remo Fenut,
afirma que o volume de vendas caiu entre 15% e 20%, na comparação com o período
pré-pandemia. Isabelle, da Lupo, informa que a queda de vendas das suas lojas
não caiu porque a marca apostou forte nas máscaras, peças obrigatórias durante
a fase mais crítica da pandemia.
Bentes, da CNC, diz que o fato de
os preços nas indústrias estarem subindo mais do que no varejo revela que mais
pressão inflacionária virá por aí. “Os preços continuarão subindo, mas numa
velocidade menor. No atacado, a alta já chegou perto de 25% e hoje está mais
perto de 20%”, diz Bentes.
COSTUREIRAS SUMIRAM
No varejo de vestuário, de acordo
com Ataíde, o fenômeno da falta de costureiras é um dos principais problemas
enfrentados pelas confecções. Quando as fábricas interromperam a produção no
momento mais crítico da disseminação do coronavírus, muitas costureiras foram
dispensadas pelas confecções. “As empresas se desesperaram e demitiram
funcionários em massa. As costureiras ou acabaram abrindo um negócio próprio em
casa, ou saíram do mercado”, diz Ataíde.
As confecções, de acordo com ele,
têm agora a opção de contratar pessoas mais jovens e treiná-las, o que não é
fácil devido ao desinteresse pela profissão. De acordo com Ataíde, entre 80% a
90% das costureiras que estão no mercado já estão contratadas e dificilmente
elas trocam de empresa.