- ATENÇÃO, os fatos narrados nesta série de artigos seguem pesquisas
apuradas na internet, tendo como base de dados reportagens da época, investigações policiais e denúncias do Ministério Público, e podem incomodar os
leitores mais sensíveis –
- Ediwilson dos Santos -
Uma
mulher jovem, loira, recatada e que vivia o seu cotidiano entre o trabalho de
vendedora e a sua casa, onde morava com seus pais. Assim era a vida de Neyde
Maria Maia Lopes até os seus 23 anos de idade. No final do ano de 1959, ela
conheceu e se envolveu com um homem casado, pediu para ele abandonar a família
e, ante a recusa, arquitetou um plano de vingança que faria os melhores
roteiristas de Hollywood passarem por amadores. Neyde Maia Lopes ficou
nacionalmente conhecida como “A Fera da Penha”, alcunha que até hoje causa
calafrios em muita gente.
A jovem
carioca simples, simpática e culta conheceu o motorista de ônibus Antônio Couto
Araújo a caminho do trabalho, na estação Central do Brasil. Presa fácil para o
experiente e sedutor motorista, Neyde logo passou a ter um romance tórrido com
Antônio, mas que ficava restrito aos encontros sexuais. Pela falta de tempo do
“namorado” em sair em público com ela, logo Neyde começou a desconfiar de que
não passava de uma amante. Confrontado, Antônio confessou ser casado, mas
tentou enganar a moça, afirmando que estava em vias de separar-se da esposa,
Nilza, mas protelava a decisão pelos filhos.
Três
meses após o início do romance e percebendo a enrolação do amante, Neyde decide
colocar em prática um plano macabro, que foi arquitetado durante seis meses,
numa desenvoltura e frieza própria de mentes doentias.
Neyde
conseguiu o endereço do amante e no início de 1960, bateu à porta da casa. Foi
atendida pela sua algoz, Nilza. Identificou-se como uma amiga dos tempos de colégio,
e Nilza, para não parecer rude com a falta de memória, recebeu-a gentilmente.
Nos meses seguintes, Neyde obteve informações íntimas da família Araújo: quem
frequentava a casa, nome dos vizinhos, rotina e horários e qual era o ponto
fraco de Antônio: - a Taninha, respondeu prontamente a esposa traída.
Taninha
era uma criança de quatro anos, a caçula e xodó de toda a família, mas
principalmente de Antônio. A menina era muito querida pelos vizinhos no bairro
da Penha, no Rio de Janeiro, e estudava em um instituto de educação infantil
perto de casa.
Em
junho, Neyde deu um ultimato a Antônio: ou largava a família, ou ele perderia o
que mais amava na vida. Incrédulo, o adúltero não deu importância à ameaça. Mas
no dia 30 de junho de 1960, a jovem, a educada e recatada moça resolveu se
vingar. Ligou para a escola de Taninha e, identificando-se como Nilza, a mãe da
criança, disse que uma vizinha iria buscar a filha mais cedo. Sem desconfiar de
nada e vendo que a criança chamava Neyde de “tia”, a representante da escola
deixou Taninha ir.
Neyde
passou algumas horas andando com a menina pelas ruas da Penha e até visitou uma
amiga, à qual Taninha foi apresentada como filha de uma amiga, da qual ela
estava cuidando. Quando a noite chegou, por volta das 20h Neyde saiu com a
criança, passou por uma farmácia, onde comprou uma garrafa com álcool, e de
mãos dadas, as duas foram até um matadouro. Lá chegando, Neyde tirou da bolsa
um revólver calibre 32 e, à queima roupa, atirou na nuca de Taninha. Em seguida
despejou o álcool na menina, ateou fogo e foi embora.
O tiro
foi ouvido por funcionários do matadouro, que ao chegarem ao local depararam-se
com a cena chocante, mas não puderam fazer nada. A polícia foi acionada e logo
as investigações chegaram até Neyde, já que ela havia deixado inúmeros rastros
da autoria, principalmente depois que o pai da vítima, Antônio, ouviu a
descrição da pessoa que havia saído com Taninha da escola.
Neyde
foi detida pela polícia quando chegava em sua casa, a cerca de dois quilômetros
do local do crime. Durante toda a noite e madrugada adentro, ela foi
interrogada, sempre negando, mesmo com todas as provas que lhe foram
apresentadas, incluindo a arma do crime e uma mecha do cabelo de Taninha - que
ela cortou com tesoura enquanto visitava a sua amiga, horas antes de cometer o
assassinado cruel – encontrados em sua bolsa.
Autorizado
a entrevistar a suspeita, o repórter Saulo Gomes (falecido em 2019 e que na
época tinha 32 anos de idade) conseguiu, com uma pergunta básica, arrancar a
declaração que chocaria o país inteiro. Indagada por que cometeu o crime, Neyde
respondeu:
“Por
que você está me perguntando isso? Quer saber? Eu só não matei a família toda
porque não tive tempo”.
As
horas e dias que sucederam a prisão de Neyde, agora ré confessa da morte brutal
de Taninha, foram de comoção e revolta popular, com centenas de pessoas
exigindo pena de morte, outras querendo invadir a delegacia para fazerem
justiça com as próprias mãos e um espetáculo do quanto sensacionalista pode ser
a imprensa em busca das especulações e dos predicados que poderiam descrever
crime e criminosa. O que foi mais aceito: “A fera da Penha”.
Em 5 de
outubro de 1963, três anos depois do crime, Neyde Maia Lopes foi condenada a 33
anos de prisão (a sentença foi confirmada em um segundo julgamento, no ano
seguinte). Devido ao seu bom comportamento, “a fera da Penha” permaneceu 15
anos presa e foi solta no dia 9 de outubro de 1975. Ela voltou para a casa dos
pais, que morreram anos depois. Neyde mora na mesma casa, a dois quilômetros da
residência de Antônio e Nilza – que perdoou o marido e o casal teve mais dois
filhos). Hoje, Neyde tem 85 anos.