Ingrid Saia
Em 12 de
dezembro de 2024, a Câmara dos Deputados aprovou, por 367 votos favoráveis, 85
contrários e 14 abstenções, o projeto de lei que prevê a castração química de
condenados por crimes de abuso e exploração sexual contra crianças e
adolescentes, além da criação de um Cadastro Nacional de Condenados por tais
práticas. A proposta segue agora para análise no Senado Federal, onde deve ser
objeto de intensos debates.
A proposta
introduz alterações ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e estabelece
a possibilidade de aplicação de castração química como parte das penas impostas
aos condenados por crimes relacionados à exploração sexual infantil. O
procedimento seria realizado por meio da administração de medicamentos inibidores
da libido.
Outro ponto
central do projeto é a criação de um cadastro nacional de pedófilos. Esse
registro incluirá informações detalhadas dos condenados com sentença transitada
em julgado, como nome, CPF e fotografias. O cadastro será gerido pelo Conselho
Nacional de Justiça (CNJ) e, conforme já previsto na Lei 15.035/24, os dados
serão de acesso público.
A aprovação da
medida gerou intenso debate entre parlamentares, especialistas e sociedade
civil. De um lado, defensores argumentam que a castração química representa uma
resposta firme contra crimes de abuso sexual infantil, buscando reduzir a
reincidência. De outro, críticos apontam que a proposta desconsidera a
complexidade do tema, além de não oferecer soluções eficazes para a prevenção
desses crimes.
A iniciativa
tem sido descrita como um exemplo de populismo penal, em que medidas extremas
são propostas para atender a demandas populares de segurança, sem
necessariamente levar em conta sua eficiência ou implicações éticas. Nesse
contexto, é fundamental questionar se a adoção de penas severas, como a
castração química, é capaz de resolver problemas estruturais relacionados à
criminalidade ou se apenas reforça uma política punitivista desconectada de
soluções mais abrangentes.
Implicações Éticas e Constitucionais
A medida
também levanta sérias questões éticas e constitucionais. Procedimentos que
alteram quimicamente o funcionamento do corpo humano podem ser considerados
violações aos princípios da dignidade da pessoa humana e da integridade física,
ambos consagrados na Constituição Federal. Além disso, o caráter compulsório da
castração química pode gerar debates acalorados sobre os limites da intervenção
estatal na esfera individual.
Críticos do
projeto também destacam que ele foca exclusivamente na punição, negligenciando
a necessidade de investimentos em políticas preventivas. A prevenção de crimes
sexuais exige uma abordagem ampla, que inclua educação sexual, campanhas de
conscientização, fortalecimento da rede de proteção à infância e apoio psicológico
a potenciais ofensores.
Com a
aprovação na Câmara dos Deputados, o projeto será analisado pelo Senado
Federal. Nesse momento, é essencial que se promova um debate aprofundado sobre
a constitucionalidade, a eficácia e as implicações éticas da castração química.
Apenas por meio de uma análise cuidadosa e fundamentada poderemos garantir que
as medidas adotadas sejam eficazes, justas e alinhadas aos princípios
democráticos.
Conclusão
Embora o
combate à exploração sexual de crianças e adolescentes seja uma prioridade
absoluta, é imprescindível que as soluções propostas sejam baseadas em
evidências, respeitem os direitos humanos e promovam a prevenção. O desafio é
encontrar o equilíbrio entre punir de forma adequada os responsáveis por crimes
tão graves e, ao mesmo tempo, prevenir novas ocorrências por meio de uma
abordagem mais abrangente e efetiva.
Ingrid Saia é advogada associada
no Vigna Advogados